acessos

terça-feira, 21 de setembro de 2010

princípio de coerência em dosimetria

Assumindo a Primeira Vara da Comarca de Nova Mutum, tive a oportunidade de aplicar a tese da coerência em dosimetria. Segue a decisão:

Sentença

Autos 43761-83/09
1. Relatório


Na Apelação 17530/2010 (fls. 290-295), declarou-se a nulidade da sentença “(...) na parte relativa à dosimetria da pena, a fim de que o Juízo de primeiro grau proceda à análise da minorante insculpida no art. 33, § 4º, Lei 11.343/06 (...)”.

2. Fundamentação


Nas anotações de fls. 80, 155 e 157, observa-se a inexistência de inscrição de condenação com trânsito em julgado, pelo que primário o réu. Não há provas de maus antecedentes, tampouco indícios de que o réu se “dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa” (art. 33, §4º, Lei 11.343/06).

Ausentes os requisitos impeditivos do art. 33, §4º, Lei 11.343/06, observa-se que, anulada pelo Acórdão na Apelação 17530/2010 a terceira fase do método trifásico, se na primeira fase (art. 59, CP), o Juízo sentenciante aplicou a pena mínima, máxima deverá ser, atendendo-se ao princípio da coerência, elemento essencial de legitimidade de decisões judiciais, a diminuição decorrente do art. 33, § 4º, Lei 11.343/06, ou seja, 2/3 (dois terços), perfazendo o total de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses.

Embora a literalidade do art. 33, § 4º, Lei 11.343/06, vede a conversão em restritivas de direitos, e o art. 2º, § 1º, Lei 8.072/90, imponha o regime inicialmente fechado, tais normas se apresentam contrárias ao princípio da proporcionalidade, da individualização da pena e da reserva judicial na fixação em concreto da prevenção e repressão. Neste sentido, STF, HC 102678/MG, Rel. Min. Eros Grau, d.j. 09.03.2010:


EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR OUTRA RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. A jurisprudência desta Corte está alinhada no sentido do cabimento da substituição da pena privativa de liberdade por outra, restritiva de direitos, nos crimes de tráfico de entorpecentes. Nesse sentido, o HC n. 93.857, Cezar Peluso, DJ de 16.10.09 e o HC n. 99.888, de que fui relator, DJ de 12.12.10. Ordem concedida.

Também, HC 101291/SP, Rel. Min. Eros Grau, d.j. 24.11.09:


EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. FIXAÇÃO DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS FAVORÁVEIS. IMPOSIÇÃO DE REGIME DE CUMPRIMENTO MAIS GRAVE DO QUE O PREVISTO EM LEI. DIREITO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR OUTRA RESTRITIVA DE DIREITOS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXCEÇÃO À SÚMULA 691. Tráfico de entorpecentes. Fixação da pena. Circunstâncias judiciais favoráveis. Pena fixada em quantidade que permite a substituição da privação de liberdade por restrição de direitos ou o início do cumprimento da pena no regime aberto. Imposição, não obstante, de regime fechado. Constrangimento ilegal a ensejar exceção à Súmula 691/STF. Ordem concedida.

No mesmo sentido,

“Apesar da proibição contida no art. 33, § 4º da Lei 11.343/06, é possível a substituição da pena por restrição de direitos, considerando que a vedação imposta configura tratamento genérico violador do princípio constitucional da proporcionalidade. A aplicação do § 4º, do art. 33, da nova lei de droga, traz à baila a figura do tráfico privilegiado, que não está elencado no rol dos crimes hediondos ou a eles equiparados, de modo que não se estabelece como regra a fixação do regime fechado para o início do cumprimento da pena” (TJMG - 5ª C. - AP 1.0647.08.091233-8 - rel. Adilson Lamou¬nier - j. 25.08.2009 - DOE 08.09.2009 - ementa não-oficial).

Assim, ante a quantidade da pena fixada, inexistindo avaliação negativa das circunstâncias do art. 59, CP, pois a primeira fase do método trifásico não foi anulada, deverá também ser positiva, para fins de coerência, a avaliação do art. 33, §3º, CP, pelo que o regime há e ser o aberto (art. 33, § 2º, alínea ‘c’, CP).

Além disso, sendo positiva a avaliação das hipóteses do art. 59, CP, na primeira fase dosimétrica (não anulada), também deverá, para fins de coerência, ser positiva a avaliação do art. 44, inc. III, CP, e, inexistindo as hipóteses impeditivas do art. 44, inc. I e II, CP, substituo a restritiva de liberdade por restritiva de direito, consistente em prestação de serviços à comunidade (art. 46, CP), em entidade a ser definida pelo Juízo da Execução, na razão do art. 46, §3º, CP.


3. Dispositivo

a) Condenado João Ferrer de Figueiredo Filho nas sanções do art. 33, caput, Lei 11.343/06, aplico-lhe a pena de reclusão de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses, a ser cumprida no regime aberto (art. 33, § 2º, alínea ‘c’, CP), substituída por restritiva de direito (art. 44, CP), consistente em prestação de serviços à comunidade (art. 46, CP), em entidade e modo a serem definidos pelo Juízo da Execução, na razão do art. 46, §3º, CP, mantidos os demais itens do dispositivo da sentença de fls. 171-176;

b) Expeça-se alvará de soltura, se por outro motivo não estiver preso ou inexistir outro mandado de prisão em aberto;

c) Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquive-se, cumprindo-se disposições administrativas inscritas na sentença de fls. 171-176.



Nova Mutum, 21.09.2010



Douglas Bernardes Romão

Juiz de Direito

Um comentário: